quinta-feira, 13 de setembro de 2018

Coluna de Setembro de 2018, para o Jornal Portal:

Sucesso, reconhecimento, fama, carreira, dinheiro e qualidade da obra são coisas distintas e, quase sempre, distantes. Embora a maioria das pessoas traga, inconscientemente, a noção de que uma decorre da outra, não é regra ocorrerem juntas, simultaneamente, nem mesmo, na sequência esperada.
Ter sucesso, significa ter êxito, planejar e realizar algo. Ter reconhecimento, significa que outras pessoas admiram e reconhecem este êxito. Ter fama, significa que, além de seus êxitos, seu nome também está vinculado a eles. Ter uma carreira, significa que você busca desenvolvê-los e aprimorá-los.
É uma ilusão achar que existe uma relação direta entre isso e a independência financeira ou a qualidade do que se faz. São coisas diferentes e independentes.
Van Gogh só foi considerado gênio depois de sua morte. Cartola gravou seu primeiro disco aos 66 anos. As partituras de Bach, depois de sua morte, eram vendidas como jornal, para embrulhar peixe. Será que essas obras melhoraram com o passar do tempo, ou a forma de avaliação, que é sempre escorregadia?
Cria-se a teoria sobre as pinceladas de Picasso ou Monet. O que era técnica grosseira passa a ser uma técnica divina. A própria falta de técnica pode passar a ser um bom critério. O julgamento acontece segundo os parâmetros de uma época, de um contexto histórico, mas a boa obra é perene.
Um artista, considerado ruim, pode, nesta perspectiva histórica, vir a ser considerado precurssor de uma tendência “genial”, em outra época, mais afastada de seu tempo. O importante é ter a inteligência de saber que ninguém é capaz de julgar a arte, afinal, nem sequer, pode-se dizer, com exatidão, o que ela é.
No entanto, é possível senti-la e saber que se manifesta através de nós. É fruto da expressão humana, algo muito complexo e, também, muito simples, como a própria vida - farta e tangível. Como explicar o que é vida? Num texto é difícil, no entanto, qualquer criança, que ainda não lê, pode compreender.
Por isso, não se deixe enganar, apesar de estarmos tão presos neste modelo de “sucesso”, sem desmerecer suas qualidades, é preciso enxergar e compreender que a arte vai muito além dele e, amiúde, é bem menos engessada ou enlatada.
O pragmatismo que vivemos, dificulta a compreensão de que existem diversas gradações de cores entre os “opostos” aos quais alternamos nossa dicotomia - amor e ódio. As outras diversas possibilidades, têm sido negligenciadas. Não conseguimos apreciar nada que esteja fora do quadrado ou que não tenha um, questionável, “selo” de qualidade.
Essa preferência por esquemas prontos e que “dão certo” - afinal, dar certo é vender - tem sido algo muito ruim, pois tira da arte parte de seu papel que é fazer pensar, questionar e incomodar. Não aponta todos os nossos podres, só os que permitimos, valorizando, apenas, sua capacidade de nos agradar.
Criou-se um roteiro, uma lista de coisas necessárias para que algo seja bom. Nós mesmos, precisamos nos sentir extremamente felizes, empolgados ou tristes para considerar, por exemplo, um filme bom. Até mesmo nossas sensações estão programadas. Se a arte imita a vida, creio que esteja faltando coisa.
Apesar do marketing ser o que gira o mundo, criando necessidades e movendo a roda do consumo, é preciso ter a consciência de que a vida é uma sucessão de momentos, tristes, felizes, vazios, cheios de esperança, de frustrações e infinitas sensações que podem ser expressas por um artista que as coleciona.
Por isso, é preciso dar oportunidade à arte, aceitar seu convite para ver outras paisagens, falar outras línguas, conhecer outras realidades, isso nos torna mais conscientes e humanos, diminui a intolerância, os preconceitos, nos torna mais cultos, mais críticos e menos impulsivos, cientes de toda nossa diversidade.
Nosso espírito tem buscado se manter preso. Tem sido preferível ficar no cativeiro do que ver outras coisas, tamanha é a repulsa ao diferente. A fantasia tem sido priorizada, apesar de a vida mostrar que, na maioria das vezes, não termina no “felizes para sempre” e, muito menos, se acabaria com o nosso sofrimento.
Quantos artistas já morreram sem ser conhecidos? Quantos vivem entre nós e só terão reconhecimento depois de sua morte? Quantos nunca terão valor? Será que Michelangelo se importaria com isso? Será que Da Vinci abdicaria de ser quem foi? Independente do reconhecimento, estavam sempre em sua busca.
A busca consiste na constante realização. Amenizando inquietações, exorcizando fantasmas, denunciando injustiças, dando voz às questões, que são de todos os seres humanos. Também pelo aprimoramento, a possibilidade de experimentar, poder errar e aprender com isso. Afinal: “O homem é o exercício que faz.” 
Mãos à obra! Não importa se o texto terá um ou um milhão de leitores. O próprio exercício de escrever é um aprendizado e basta que isso satisfaça. Se, além disso, ainda houver outra pessoa reativa ao conteúdo, seja a favor ou contra, a comunicação foi feita e o ciclo se completou, cabendo agora a ela, reagir.  
Até a próxima!!!

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