terça-feira, 27 de junho de 2017

Coluna da Maio/ 2017 para o Jornal Portal

Esses dias, revendo o “Programa Ensaio” do Djavan, concebido e dirigido pelo Fernando Faro, onde o artista em foco, responde às perguntas que não ouvimos e que vão montando um mosaico da sua vida, me atentei a uma resposta que não tinha percebido antes, na qual dizia que seu álbum “Meu lado” tinha sido o de menor expressão e senti um tom de “ faz parte, temos altos e baixos.”
Fiquei impressionado, pois, em minha opinião, além de ser um dos melhores discos de sua carreira, é um dos melhores que já ouvi, em termos de repertório, levadas, arranjos, timbres e expressão de swing e brasilidade. Sempre foi, para mim, junto com seu outro álbum “Novena” uma referência de concepção de disco, um Norte para tudo que faço. Como explicar isso? Se eu pudesse me tornar o Djavan que gosto, seria um Djavan que, para ele mesmo, não deu muito certo.
Será que é verdade que é preciso vender milhões de cópias e tocar na rádio para dar certo? Todos os meus amigos músicos amam esse álbum. Só por isso, já não teria dado certo? Será que ele tem consciência disso? Talvez isso mudasse sua concepção sobre o disco. Isso me fez pensar sobre idiossincrasia.
Ter a consciência de que somos portadores de uma pequena fração da verdade é muito importante. A nossa verdade é fruto do que conseguimos enxergar, relacionar e, consequentemente, interpretar para reagir. Porém, nunca teremos consciência de sua plenitude, de toda influência que recebemos, nem que exercemos a nossa volta. Por isso, somos o parâmetro e os outros, o termômetro.
Estar atento a opiniões diferentes pode nos fazer crescer e expandir nossos horizontes e limites. Ao exercitar a empatia, nos colocando no lugar do outro e entendendo seus pontos de vista e motivações, podemos nos repensar e reestruturar. Assim, fortalecemos nossa visão anterior, se nada do que foi dito nos valer. Aprumamos nossa direção, se os equívocos do outro, forem usados como dicas de como não proceder. Tornamo-nos mais acertivos e confiantes em nossa caminhada, se percebemos que dividimos muitas ideias semelhantes com alguém que já atingiu um objetivo que buscamos. Ou, até, percebemos que estamos totalmente equivocados e que, a partir dali, será preciso reavaliar e recomeçar.
No entanto, devemos nos atentar, pois todos somos influenciados e influenciamos naturalmente, por isso, ouvir uma opinião - que muitas vezes vem sob a forma de crítica - não nos obriga a mudar ou aceitá-la. Trata-se apenas de conhecer fronteiras, de situar-se. Não devemos permitir que isso nos faça mal e, se esta opinião não for construtiva, nem dada de forma amigável, não devemos nem ouvi-la. Pois, na verdade, não deveria ter sido emitida, já que não visa agregar e, sim, ofender ou demonstrar uma superioridade irreal e mentirosa.
Muitas vezes, não existe no outro, o hábito de fazer o exercício da empatia. Apenas, foi concedido pela sociedade, ou por si mesmo, um título de portador da verdade que o permite ser babaca. Fernando Pessoa dizia: “ A renúncia é a libertação. Não querer é poder.”
Quando aprendemos a dizer não, para os outros e para nós, crescemos bastante. Dizer não a uma crítica e seguir adiante, é usá-la como alavanca. Dizer não a uma opinião contrária, pode ser uma forma de equilibrar o jogo e reposicionar as forças. Dizer não a um desejo fútil, nos torna mais fortes. Dizer não a quem não nos dá valor, nos valoriza - Não querer é poder! “Quando um não quer, dois não brigam”, mas, do seu mal uso, vem o fazer “doce” ou “cera”... A forma infantil de lidar com ele. Quando um não quer, dois não fazem nada!
Assim, como saber dizer “não” é importante, saber ouvi-lo também é. Podemos ouvi-lo como fim de tudo ou como um recomeço. Mas devemos sempre ter em mente que um “sim” ou um “não”, são frutos de uma opinião, de um contexto e de uma conjuntura, por isso, não expressam toda a pluralidade de uma situação, apenas, como disse antes, uma fração dela. Se já não é possível termos plena consciência da influência que recebemos e que podemos exercer em apenas um instante, imagine, com o decorrer do tempo. Hoje, quando usamos a expressão “viralizar”, temos uma breve noção do que chamam de sucesso e influência, mas, ao contrário, temos muita dificuldade para entender o que é “sororidade”. 
O “mercado” é algo que tem que ser medido aqui e agora, mas a influência de um trabalho faz curvas. Álbuns são redescobertos e viram referência em determinados assuntos que, na sua época, não se tinha interesse. Isso faz parte da vida, em diversas áreas, é uma questão de afinidade, identificação e momento.
Dave Brubeck, pianista e compositor que se interessou por compassos não usuais, no final da década de 1950, causou impacto com seus álbuns “Time out” e “Time further out”, mas sua influência vem aumentando, gradativamente, e chegou até o Choro carioca, cinco décadas depois em: “Choro ímpar” de Maurício Carrilho, de 2007. Ele era um visionário? Pode ser... Mas existe também um hiato de tempo para que as coisas sejam absorvidas e seu uso se torne comum.   
O disco “Meu lado” é primoroso. Influenciou e ainda influencia a muitos músicos. Talvez, isso não seja o que a indústria chame de sucesso, mas tenho o maior carinho em divulgá-lo aos alunos, amigos e, agora, para vocês. Para mim, foi bem sucedido e encontra-se entre os meus 10 prediletos. Então, eu pergunto: para um artista, o que é mais importante, estar entre os top 10 da Billboard ou nos top 10 de vários lares? Até a próxima!

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