Tenho levantado constantemente, aqui na coluna, questões sobre o mercado musical, tendo sempre como intuito, provocar o pensamento crítico e questionar as “verdades”, através da compreensão dos fatos, com esperança numa profunda transformação. Para isso, trago várias perguntas e, nunca, respostas prontas.
Creio que qualquer pessoa deva, ao menos tentar, desenvolver questionamentos sobre seu lugar, suas atitudes, relações e contextos nos quais se encontra inserido socialmente. Jamais se contentando com o “porque sim” estabelecido, mas, sempre de forma crítica e, principalmente, construtiva.
O que vivemos, hoje, na música, não é exclusivo, apenas, dessa atividade, mas universal. As dificuldades, desencontros, dilemas e problemas são comuns a diversas profissões, porque não se originam das especificidades técnicas, mas, da forma como o ser humano lida com as relações profissionais e interpessoais.
Apesar de semelhantes, não somos iguais e, por isso, temos necessidades, gostos e opiniões diferentes. O que agrada a um, incomoda a outro e, de uma forma geral, a falta de flexibilidade necessária para aceitar, respeitar e conviver com opniões diferentes das que consideramos “certas” é a base dos nossos conflitos.
Há mais de dois milênios, na Grécia antiga, pensadores já discutiam os limites das liberdades, direitos e deveres, tentando chegar a um entendimento sobre a conduta de cada cidadão, pessoal e coletivamente. Tentando compreender a melhor forma de agir em suas relações pessoais e, por consequência, profissionais.
A isso, deram o nome de Ética. Obviamente, como as culturas são muito complexas e diferentes, é possível se observar variações em suas aplicações, mas nunca em seu conceito básico. Apesar de sua interpretação poder mudar, ela visa sempre a melhor forma, para todos, de se proceder em qualquer situação.
Diante disso, podemos traçar um paralelo interessante entre os problemas que vivemos nos meios profissionais, compreendendo que estes advém dos econômicos, sociais e pessoais. A música não vive, isoladamente, uma fase ruim, mas, o ser humano, praticamente de todo o globo, vive uma crise moral e ética.
Nem sempre, na história, o mercado foi nocivo. Já houve um tempo em que se trocava mercadorias que eram de interesse mútuo e, quando não eram, havia a moeda, que servia como “vale”, permitindo ao portador, trocá-la por algo de seu interesse. Obviamente, já haviam as pessoas que em vez de produzir, usavam seu tempo buscando formas de enganar outros mercadores ou driblar as regras para benefício próprio. Assim, se estabelecia o antiético e a generalização.
Hoje, em pleno 2018, vejo, crianças e adultos, inflacionando figurinhas da copa do mundo, vendendo mais caro ou trocando uma por dez. O ser humano consegue perceber o interesse alheio e tirar vantagem disso, não sei se por obra da FIFA, da própria editora ou por má índole, aplicando-lhes as “maravilhas” do mercado.
A escassez de algo, gera grande procura e, consequentemente, faz com que pessoas mais abastadas paguem mais caro, na intenção de garantir sua obtenção. Isso faz parte do antigo mercado. Porém, o novo mercado, que já estudou o antigo, cria a escassez para aumentar o preço e a procura por seu produto.
Quem acaba de entrar no mercado de trabalho, considera “regra natural” a obsolescência programada e a atualização seletiva, aplicam-nas sem dó, tornando o mundo globalizado cada vez mais predatório e distante do utópico planeta, onde haveria serviço de qualidade, feito com prazer e igualdade de oportunidades.
Na música, esta lavagem cerebral nos leva a ouvir apenas o que está na moda, afinal se não fosse bom, não estaria. Mas é bom questionar se é considerada ruim por estar na moda, ser comercial, tocar na rádio ou na TV. E é claro que a resposta será não. É preciso cuidado para que a crítica não se assemelhe a uma inveja barata.
Desde que exista um artista que, genuinamente, se propõe a fazer sua arte e um público que o prestigie, todo juízo de valor sobre ela é um ônus, exclusivo, de quem julga. O problema, não é sua existência, mas o espaço ocupado por ela, que não permite à outra, sequer, ter a oportunidade de ser mostrada.
Existem distorções nos três níveis: em relação ao mercado, essa exclusividade, cria uma imagem distorcida de que todos no planeta amam apenas uma determinada coisa. O que é desproporcional a quantidade e variedade de coisas que existem no mundo, somos 8 bilhões de pessoas e é saudável que não tenhamos o mesmo gosto, certo?
Em relação ao público, a distorção acontece quando ele, apesar de achar tudo ruim, consome o que não gosta e não se identifica, tal como acontece com as drogas, que são horríveis na mão dos bandidos, geram dinheiro sujo, corrupção e guerra, no entanto, chegam às mão de quase todos os nossos amigos.
Em relação ao artista, quando ele deixa de mostrar sua verdade, com o objetivo, exclusivo, de agradar e lucrar, existe outra distorção. Fazer para agradar é estar um passo atrás de quem agrada espontaneamente.
A verdade da arte é, em meio a tantas verdades, um ponto de vista, através do qual o artista prende e toca o público, que, por sua vez, traz sua verdade e ganha a oportunidade de enxergar, sob novo prisma, permitindo-lhe questionar suas certezas e evoluir, amadurecendo.
Para o infinito e além! Até a próxima!
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