Quando alguém pergunta quem foi o maior compositor, instrumentista, cantor, regente ou arranjador de todos os tempos, costumo responder perguntando de volta, a opinião dessa pessoa e o motivo. Normalmente, essa resposta varia de acordo com o gosto. Não somos isentos, principalmente no que tange a música.
Independente da capacidade técnica do músico que avaliamos, existem vários outros parâmetros subjetivos que envolvem essas opiniões, muitas vezes motivadas pelo pioneirismo ou por grandes feitos, às vezes reais e, muitas vezes, inventado por fãs ou, na falta deles, pelo próprio músico.
Ser um instrumentista super técnico, um “virtuose”, não dá a esse músico garantia de que as pessoas gostarão de ouvi-lo. Pode se tocar muito e ser hermético, tornando difícil digeri-lo; tocar pouco e ter uma capacidade imensa de se comunicar; não tocar nada e não agradar (normalmente, esses são os polêmicos a quem nada e ninguém agrada) e, finalmente, tocar muito e agradar.
A dificuldade de julgar é natural, pois também diz respeito a várias camadas sobrepostas acumuladas pelo mesmo artista, que muitas vezes não é só músico, mas também, cantor, compositor, letrista e instrumentista de mais de um instrumento. Tornando impossível fazer tudo o que se propõe num mesmo nível.
Dizendo buscar maior coerência nessas avaliações, surgiram revistas especializadas que separavam melhor os nichos, seus representantes mais importantes e conhecidos. Porém, apesar de permitir que o grande público percebesse que dois artistas pudessem ser melhores em estilos diferentes, mantiveram as enquetes de “melhor do mundo” que geram polêmica e discussão sem levar a lugar nenhum.
É importante lembrar que a técnica, tão considerada pelos fãs, é apenas a maneira de se conseguir atingir as ideias, ou seja, se você não tem ideias, a técnica não te adianta de nada. A música tratada através de recordes e números é vazia. A magia do circo é muito mais importante que o recorde olímpico.
Não pense que faço alguma crítica ao esporte. Não. Faço à busca do recorde, do Guiness, do título. Pois todas essas glórias são transitórias (sic transit gloria mundi) enquanto a arte, quando arte, é perene. Feita para se assemelhar a grandeza da natureza e não para enaltecer um homem ou um nome.
Lembro quando Jô Soares, entrevistou B.B. King, dando muita ênfase a velocidade de Joe Satriani, Yngwie Malmsteen e Steve Vai, que deve ter sido proposital, forçando a resposta do velho:
“ - Os meninos estão procurando as notas que eu já encontrei.”
O Blues é um belo exemplo, onde a pura técnica, não vale nada. Se você não nasceu ouvindo o estilo, é preciso entender seu sistema e, depois, usar seu feeling para tocar longas notas que fazem o instrumento chorar. Já que Blues significa saudade, melancolia, tristeza...
No sistema blues a quantidade de compassos, acordes e notas usadas são sabidas previamente. Na tonalidade de Dó, cuja escala é Dó, Ré, Mi, Fá, Sol, Lá e Si; as notas usadas no solo vão além dessas, usando as “outsides” Mib (a terceira menor), Sib (a sétima menor) e a “blue note” Fá# (quarta aumentada).
Um conhecido Blues Boy (B.B.) Robert Johnson também ficou conhecido por fazer, além de sua música, um pacto com o diabo, para se tornar o melhor guitarrista do mundo, a história citada no filme “A encruzilhada” que teve como protagonista o ator Ralph Macchio (de Karatê kid) e Steve Vai como o guitarrista do diabo.
Aqui no Brasil os violeiros costumam colocar o guizo de uma cascavel no instrumento, para tocar mais que o violeiro a quem desafia etc... Estas histórias fazem parte do folclore, das lendas e mitos que habitam o imaginário dos fãs e trabalhadores do meio, pasmem, não apenas da música popular...
Depois de perceber que tais histórias causam mais interesse dos fãs, muitos artistas do mercado criaram lendas a sua volta e algumas vezes, para sair do status de lenda, passaram a ter atitudes escrotas para serem presos, pagar fiança e criar a imagem de bad boy, que vende...
Falando de vendas, a segmentação do mercado permitiu que existam, além de vários melhores do mundo, muitas categorias de prêmio como no Grammy. Pode se fazer música segundo um parâmetro específico, que agrada apenas a um nicho e ser o melhor do mundo naquilo.
Tais títulos são muito mais restritos do que seus nomes pretendem dizer. Muito mais contextuais à época, à cultura, ao estilo, ao mercado, ao país etc... Na década de 70, Jaco Pastorius era considerado o melhor baixista do mundo, hoje talvez seja Victor Wooten ou o Flea (do Red Hot Chilli Peppers).
Eu, particularmente, gosto dos que jogam para o time, fazendo o melhor pra música e, provavelmente, devem estar fora de qualquer pesquisa: Maurício Maestro do Boca Livre e Sir Paul McCartney dos Beatles.
O melhor é quem nós mais gostamos. Deixem os outros com suas opiniões, há espaço para todos!
Boa Copa e até a próxima!
quarta-feira, 20 de junho de 2018
Coluna de Maio de 2018 para o Jornal Portal
Tenho levantado constantemente, aqui na coluna, questões sobre o mercado musical, tendo sempre como intuito, provocar o pensamento crítico e questionar as “verdades”, através da compreensão dos fatos, com esperança numa profunda transformação. Para isso, trago várias perguntas e, nunca, respostas prontas.
Creio que qualquer pessoa deva, ao menos tentar, desenvolver questionamentos sobre seu lugar, suas atitudes, relações e contextos nos quais se encontra inserido socialmente. Jamais se contentando com o “porque sim” estabelecido, mas, sempre de forma crítica e, principalmente, construtiva.
O que vivemos, hoje, na música, não é exclusivo, apenas, dessa atividade, mas universal. As dificuldades, desencontros, dilemas e problemas são comuns a diversas profissões, porque não se originam das especificidades técnicas, mas, da forma como o ser humano lida com as relações profissionais e interpessoais.
Apesar de semelhantes, não somos iguais e, por isso, temos necessidades, gostos e opiniões diferentes. O que agrada a um, incomoda a outro e, de uma forma geral, a falta de flexibilidade necessária para aceitar, respeitar e conviver com opniões diferentes das que consideramos “certas” é a base dos nossos conflitos.
Há mais de dois milênios, na Grécia antiga, pensadores já discutiam os limites das liberdades, direitos e deveres, tentando chegar a um entendimento sobre a conduta de cada cidadão, pessoal e coletivamente. Tentando compreender a melhor forma de agir em suas relações pessoais e, por consequência, profissionais.
A isso, deram o nome de Ética. Obviamente, como as culturas são muito complexas e diferentes, é possível se observar variações em suas aplicações, mas nunca em seu conceito básico. Apesar de sua interpretação poder mudar, ela visa sempre a melhor forma, para todos, de se proceder em qualquer situação.
Diante disso, podemos traçar um paralelo interessante entre os problemas que vivemos nos meios profissionais, compreendendo que estes advém dos econômicos, sociais e pessoais. A música não vive, isoladamente, uma fase ruim, mas, o ser humano, praticamente de todo o globo, vive uma crise moral e ética.
Nem sempre, na história, o mercado foi nocivo. Já houve um tempo em que se trocava mercadorias que eram de interesse mútuo e, quando não eram, havia a moeda, que servia como “vale”, permitindo ao portador, trocá-la por algo de seu interesse. Obviamente, já haviam as pessoas que em vez de produzir, usavam seu tempo buscando formas de enganar outros mercadores ou driblar as regras para benefício próprio. Assim, se estabelecia o antiético e a generalização.
Hoje, em pleno 2018, vejo, crianças e adultos, inflacionando figurinhas da copa do mundo, vendendo mais caro ou trocando uma por dez. O ser humano consegue perceber o interesse alheio e tirar vantagem disso, não sei se por obra da FIFA, da própria editora ou por má índole, aplicando-lhes as “maravilhas” do mercado.
A escassez de algo, gera grande procura e, consequentemente, faz com que pessoas mais abastadas paguem mais caro, na intenção de garantir sua obtenção. Isso faz parte do antigo mercado. Porém, o novo mercado, que já estudou o antigo, cria a escassez para aumentar o preço e a procura por seu produto.
Quem acaba de entrar no mercado de trabalho, considera “regra natural” a obsolescência programada e a atualização seletiva, aplicam-nas sem dó, tornando o mundo globalizado cada vez mais predatório e distante do utópico planeta, onde haveria serviço de qualidade, feito com prazer e igualdade de oportunidades.
Na música, esta lavagem cerebral nos leva a ouvir apenas o que está na moda, afinal se não fosse bom, não estaria. Mas é bom questionar se é considerada ruim por estar na moda, ser comercial, tocar na rádio ou na TV. E é claro que a resposta será não. É preciso cuidado para que a crítica não se assemelhe a uma inveja barata.
Desde que exista um artista que, genuinamente, se propõe a fazer sua arte e um público que o prestigie, todo juízo de valor sobre ela é um ônus, exclusivo, de quem julga. O problema, não é sua existência, mas o espaço ocupado por ela, que não permite à outra, sequer, ter a oportunidade de ser mostrada.
Existem distorções nos três níveis: em relação ao mercado, essa exclusividade, cria uma imagem distorcida de que todos no planeta amam apenas uma determinada coisa. O que é desproporcional a quantidade e variedade de coisas que existem no mundo, somos 8 bilhões de pessoas e é saudável que não tenhamos o mesmo gosto, certo?
Em relação ao público, a distorção acontece quando ele, apesar de achar tudo ruim, consome o que não gosta e não se identifica, tal como acontece com as drogas, que são horríveis na mão dos bandidos, geram dinheiro sujo, corrupção e guerra, no entanto, chegam às mão de quase todos os nossos amigos.
Em relação ao artista, quando ele deixa de mostrar sua verdade, com o objetivo, exclusivo, de agradar e lucrar, existe outra distorção. Fazer para agradar é estar um passo atrás de quem agrada espontaneamente.
A verdade da arte é, em meio a tantas verdades, um ponto de vista, através do qual o artista prende e toca o público, que, por sua vez, traz sua verdade e ganha a oportunidade de enxergar, sob novo prisma, permitindo-lhe questionar suas certezas e evoluir, amadurecendo.
Para o infinito e além! Até a próxima!
Creio que qualquer pessoa deva, ao menos tentar, desenvolver questionamentos sobre seu lugar, suas atitudes, relações e contextos nos quais se encontra inserido socialmente. Jamais se contentando com o “porque sim” estabelecido, mas, sempre de forma crítica e, principalmente, construtiva.
O que vivemos, hoje, na música, não é exclusivo, apenas, dessa atividade, mas universal. As dificuldades, desencontros, dilemas e problemas são comuns a diversas profissões, porque não se originam das especificidades técnicas, mas, da forma como o ser humano lida com as relações profissionais e interpessoais.
Apesar de semelhantes, não somos iguais e, por isso, temos necessidades, gostos e opiniões diferentes. O que agrada a um, incomoda a outro e, de uma forma geral, a falta de flexibilidade necessária para aceitar, respeitar e conviver com opniões diferentes das que consideramos “certas” é a base dos nossos conflitos.
Há mais de dois milênios, na Grécia antiga, pensadores já discutiam os limites das liberdades, direitos e deveres, tentando chegar a um entendimento sobre a conduta de cada cidadão, pessoal e coletivamente. Tentando compreender a melhor forma de agir em suas relações pessoais e, por consequência, profissionais.
A isso, deram o nome de Ética. Obviamente, como as culturas são muito complexas e diferentes, é possível se observar variações em suas aplicações, mas nunca em seu conceito básico. Apesar de sua interpretação poder mudar, ela visa sempre a melhor forma, para todos, de se proceder em qualquer situação.
Diante disso, podemos traçar um paralelo interessante entre os problemas que vivemos nos meios profissionais, compreendendo que estes advém dos econômicos, sociais e pessoais. A música não vive, isoladamente, uma fase ruim, mas, o ser humano, praticamente de todo o globo, vive uma crise moral e ética.
Nem sempre, na história, o mercado foi nocivo. Já houve um tempo em que se trocava mercadorias que eram de interesse mútuo e, quando não eram, havia a moeda, que servia como “vale”, permitindo ao portador, trocá-la por algo de seu interesse. Obviamente, já haviam as pessoas que em vez de produzir, usavam seu tempo buscando formas de enganar outros mercadores ou driblar as regras para benefício próprio. Assim, se estabelecia o antiético e a generalização.
Hoje, em pleno 2018, vejo, crianças e adultos, inflacionando figurinhas da copa do mundo, vendendo mais caro ou trocando uma por dez. O ser humano consegue perceber o interesse alheio e tirar vantagem disso, não sei se por obra da FIFA, da própria editora ou por má índole, aplicando-lhes as “maravilhas” do mercado.
A escassez de algo, gera grande procura e, consequentemente, faz com que pessoas mais abastadas paguem mais caro, na intenção de garantir sua obtenção. Isso faz parte do antigo mercado. Porém, o novo mercado, que já estudou o antigo, cria a escassez para aumentar o preço e a procura por seu produto.
Quem acaba de entrar no mercado de trabalho, considera “regra natural” a obsolescência programada e a atualização seletiva, aplicam-nas sem dó, tornando o mundo globalizado cada vez mais predatório e distante do utópico planeta, onde haveria serviço de qualidade, feito com prazer e igualdade de oportunidades.
Na música, esta lavagem cerebral nos leva a ouvir apenas o que está na moda, afinal se não fosse bom, não estaria. Mas é bom questionar se é considerada ruim por estar na moda, ser comercial, tocar na rádio ou na TV. E é claro que a resposta será não. É preciso cuidado para que a crítica não se assemelhe a uma inveja barata.
Desde que exista um artista que, genuinamente, se propõe a fazer sua arte e um público que o prestigie, todo juízo de valor sobre ela é um ônus, exclusivo, de quem julga. O problema, não é sua existência, mas o espaço ocupado por ela, que não permite à outra, sequer, ter a oportunidade de ser mostrada.
Existem distorções nos três níveis: em relação ao mercado, essa exclusividade, cria uma imagem distorcida de que todos no planeta amam apenas uma determinada coisa. O que é desproporcional a quantidade e variedade de coisas que existem no mundo, somos 8 bilhões de pessoas e é saudável que não tenhamos o mesmo gosto, certo?
Em relação ao público, a distorção acontece quando ele, apesar de achar tudo ruim, consome o que não gosta e não se identifica, tal como acontece com as drogas, que são horríveis na mão dos bandidos, geram dinheiro sujo, corrupção e guerra, no entanto, chegam às mão de quase todos os nossos amigos.
Em relação ao artista, quando ele deixa de mostrar sua verdade, com o objetivo, exclusivo, de agradar e lucrar, existe outra distorção. Fazer para agradar é estar um passo atrás de quem agrada espontaneamente.
A verdade da arte é, em meio a tantas verdades, um ponto de vista, através do qual o artista prende e toca o público, que, por sua vez, traz sua verdade e ganha a oportunidade de enxergar, sob novo prisma, permitindo-lhe questionar suas certezas e evoluir, amadurecendo.
Para o infinito e além! Até a próxima!
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